quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Diálogos Sobre Desenvolvimento Comportamental

Evento promovido no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, com entrada gratuita.
Organizadores: Tauane Paula Gehm, Lígia Mosolino de Carvalho e Ana Carolina Macchione.



Apresentadores:

João Cláudio Todorov (IESB)
Maria Stella Coutinho de Alcântara Gil (UFSCAR)
Carolina Laurenti (UEM)
Carlos Eduardo Tavares (USP)
Tauane Paula Gehm (USP)
Christiana G. M. de Almeida, Naiara Minto de Sousa e Lucas Tadeu Garcia (UFSCAR)
Ana Carolina Macchione (Núcleo Paradigma)
Pedro Fonseca Zuccolo (USP)
Paula S. Gióia (PUC)
Cintia Guilhardi, Leila Bagaiolo e Claudia Romano (Gradual)
Cássia Leal da Hora (PUC e Núcleo Paradigma)
Lygia Dorigon (Núcleo Paradigma)
Jaíde Regra (Consultório particular)




sábado, 11 de agosto de 2012

O que é DESENVOLVIMENTO para a Análise do Comportamento (AC)?


A teoria analítico-comportamental do desenvolvimento é enquadrada no campo da ciência natural (Bijou, 1993/1995). Bijou e Baer (1961) definem teoria como um grupo coerente de proposições gerais (i.e., definição de termos e princípios de relação entre termos) usadas como formulações explicativas para uma classe de fenômenos. Já a ciência natural é entendida como aquela que estuda qualquer fenômeno natural, derivando seu conhecimento de eventos observáveis ao olho nu ou observáveis por meio de instrumentos. A proposta da AC para a compreensão do desenvolvimento se enquadra nos padrões das ciências naturais porque as afirmações teóricas são proposições generalizadas sobre interações observáveis entre organismo e ambiente (Bijou, 1993/1995; Schlinger, 1995; Novak, & Peláez, 2004).
Em consonância com as ciências naturais, Bijou e Baer (1961) definiram o desenvolvimento como mudanças progressivas na interação entre um organismo e seu ambiente. Se destrincharmos os elementos presentes nessa definição, tem-se o destaque para dois aspectos:
a.       Mudanças progressivas. Segundo Ruiz e Baer (1996), o aspecto progressivo teria dois sentidos. O primeiro deles se refere à descrição sucessiva das diferenças qualitativas nas interações organismo-ambiente, de forma que o único papel da palavra “progressivo” seja permitir o reconhecimento de que cada mudança no comportamento se leva a cabo com base nas interações organismo-ambiente que a precedem. No segundo sentido, destaca-se que não apenas as interações que precederam de modo imediato qualquer mudanças no comportamento são importantes, mas também se considera quaisquer outras variáveis históricas que possam ser relevantes. Essa definição de desenvolvimento permite, portanto, contemplar as mudanças comportamentais como baseadas no que já ocorreu e no que ocorre no momento da interação específica (Novak & Peláez, 2004). Destaca-se também que o caráter progressivo não resulta em uma noção de melhoria, progresso ou direção única do desenvolvimento (Vasconcelos, Naves, & Ávila, 2010).
b.      Mudanças na interação entre o organismo e seu ambiente. Essas interações são consideradas interdependentes e contínuas. Aquilo que o organismo faz altera aspectos do ambiente e este, por sua vez, retroage sobre as ações do organismo (Vasconcelos, Naves, & Ávila, 2010). Portanto, o desenvolvimento implica bidirecionalidade de controle entre organismo e ambiente.
De forma semelhante, Ribes (1996) sugere que o estudo do desenvolvimento consiste na reconstrução teórica do comportamento ao longo do tempo, permitindo a observação de uma tendência geral na mudança e organização comportamental em cada momento. Na medida em que marca a história de interações do indivíduo, o estudo do desenvolvimento permite elucidar fatores disposicionais. Ou seja, trata-se de esclarecer a facilidade ou interferência criada pela história em novas formas de organização do comportamento e na aquisição de determinadas competências. Nesse sentido e em consonância com a definição de Bijou e Baer (1961), Ribes (1996) concebe o desenvolvimento como a interação histórica das capacidades comportamentais no transcurso do tempo: as competências comportamentais adquiridas progressivamente se convertem na condição necessária para o desenvolvimento de novas competências comportamentais. 
Em suma, o aspecto crítico no estudo do desenvolvimento é o caráter progressivo das mudanças nas interações, de forma que a história pregressa interfira probabilisticamente em aspectos qualitativos e quantitativos das interações presentes e as interações presentes interfiram nas futuras. Por se referir a fatores apenas disposicionais, a análise diacrônica não retira a necessidade de uma análise sincrônica, cujo papel é determinar aquelas condições e processos presentes no momento em que a interação acontece.


Referências:
Bijou, S. W. (1995). Behavior Analysis of Child Development. Reno: Context Press. Segunda revisão. Versão original em 1993.
Bijou, S. W.; & Baer, D. M. (1961). Child development, 1: A systematic and empirical theory. The Century psychology series. New York: Appleton-Century-Crofts. 
Novak, G.; & Peláez, M. (2004). Child and Adolescent Development. Califórnia: Sage publications.
Ribes, E. (1996). Reflexiones sobre la naturaliza de uma teoria del desarrollo del comportamiento y su aplicación. Em: Bijou, S. W.; & Ribes, E. (cords). El desarrollo del comportamiento. México: Universidad de Guadalajara. pp. 267-282.
Ruiz, J. R.; & Baer, D. M. (1996). Un punto de vista analítico-conductual del desarrollo. Em: Bijou, S. W.; & Ribes, E. (cords). El desarrollo del comportamiento. México: Universidad de Guadalajara. pp. 203-241.
Schlinger, H. D. Jr. (1995). A behavior Analytic View of Child Development. New York: Plenum Press.
Vasconcelos, L. A.; Naves, A, R. C. X.; & Ávila, R. R. (2010). Abordagem Analítico-comportamental do Desenvolvimento. Em: E. Z. Tourinho; S. V. de Luna. Análise do comportamento: Investigações Históricas, Conceituais e Aplicadas. São Paulo: Roca.



sexta-feira, 8 de junho de 2012

A proposta analítico-comportamental para o estudo do desenvolvimento: sugestões bibliográficas


Recentemente, eu me dei conta de uma tremenda falha no blog: eu ainda não havia postado sobre a proposta analítico-comportamental do desenvolvimento psicológico. Neste momento, estou justamente escrevendo sobre isso na minha dissertação. Assim que estiver pronta, eu divulgo. Por hora, parece interessante sugerir alguns textos importantes da área para aqueles que estiverem interessados no tema.

Sidney W. Bijou (1908-2009) e Donald M. Baer (1931-2002) foram, possivelmente, os mais importantes nomes no estudo do desenvolvimento comportamental. Além de influenciados pelas ideias de Skinner, eles também foram influenciados pelo interbehaviorismo kantoriano. Kantor sugeriu a existência de três estágios do desenvolvimento, baseados no tipo principal de interação que ocorre em cada um deles – ou seja, trata-se de uma classificação de natureza funcional. Os três estágios são: (1) estágio fundacional; (2) estágio básico; e (3) estágio societal. Vale a pena dar uma olhada na descrição de cada um nos livros de Bijou e Baer, ou nos livros do próprio Kantor. Como leitura básica, eu sugiro:



  1. Bijou, S. W.; & Baer, D. M. (1961). Child development, Vol. 1: A systematic and empirical theory. The Century psychology series. New York: Appleton-Century-Crofts. Esse livro passou por duas revisões, uma em 1978, outra em 1993. Foi traduzido para o espanhol e para o português.
  2. Bijou, S. W.; & Baer, D. M. (1965). Child development, Vol. 2: The universal stage of infancy. New York: Appleton.
  3.  Bijou, S. W.; & Baer, D. M. (1967). Child development, Vol. 3: readings  in experimental analysis. New York: Appleton.
  4.  Bijou, S. W. (1993). Behavior Analysis of Child Development. Reno: Context Press. Segunda revisão. Embora esse livro seja uma revisão do livro do item “a”, ele foi publicado sem a parceria de Baer. Até onde eu sei, ainda não foi traduzido para o português.

            Alguns artigos e capítulos de livros publicados por Bijou e\ou Baer também podem ser de interesse:

  1. Bijou, S. W. (1968). Ages, stages, and the naturalization of human development. American Psychologist, 23(6), 419-427.
  2.  Baer, D. M. (1973). The control of developmental process: Why wait? In: J. R. Nesseroade, & H. W. Reese (Eds.). Ufe-span developmental psychology: Methodological issues. New York: Academic Press.
  3. Bijou, S. W. (1975). Development in the preschool years: A functional analysis. American Psychologist, 30(8), 829-837.
  4. Bijou, S. W. (1979). Some clarifications on the meaning of behavior analysis of child development. The Psychological Record, 29(1), 3-13.

Há ainda publicações didáticas sobre a proposta analítico-comportamental que, embora não tenham sido escritas por Bijou e Baer, pautaram-se na concepção deles de desenvolvimento:

  1. Gewirtz, J. L.; & Peláez-Nogueras, M. (1992). B. F. Skinner’s Legacy to Human Infant Behavior and Development. American Psychologist. pp. 1411-1422.
  2. Schlinger, H. D. (1995). A behavior analytic view of child development. New York, Plenum Press.
  3. Novak, G. (1996). Developmental psychology: Dynamical systems and behavior analysis. Reno, NV, Context Press.
  4. Novak, G.; & Peláez, M. (2004). Child and Adolescent Development. Califórnia: Sage publications.

Para aqueles que quiserem mergulhar ainda mais no estudo do desenvolvimento, eu sugiro leituras um pouco mais avançadas:

  1. Kuo, Z. Y. (1967). The Dynamics of Behavior Development: An Epigenetic view. New York: Random House.
  2. Catania, A. C. (1973) The Psychologies of Structure, Function, and Development. American Psychologist, 28, 434-443.
  3. Richelle, M. N. (1993). Piaget and Skinner: Constructivism and Behaviourism. In: M. N. Richelle. B. F. Skinner: A Reappraisal. Hove: Lawrence Erlbaum Associates Ltd. pp. 75- 84.
  4. Bijou, S. W.; & Ribes, E. El desarrollo del comportamiento. México: Universidad de Guadalajara. Arrisco-me a dizer que, entre todos os livros que eu já li sobre o tema, este é o melhor! Trata-se de uma coletânea de textos críticos produzidos a partir das conferências realizadas no “Segundo Simposio Bienal sobre Ciencia de la Conducta”, na Universidade Nacional Autônoma do México, em 1992, com o tema “desenvolvimento comportamental”. O simpósio foi planejado para ser uma reunião acadêmica de alto nível que analisaria criticamente o desenvolvimento, incluindo-se apresentações de natureza conceitual, trabalhos de revisão empírica e artigos de carácter metodológico. É realmente muito bom! O livro também foi publicado em inglês, mas em formato reduzido.
  5.  Rosales-Ruiz, J. and D. M. Baer (1997). Behavioral Cusps: A developmental and pragmatic concept for behavior analysis. Journal of Applied Behavior Analysis, 30(3), 533-544.

Por fim, para aqueles que não leem em inglês, há um capítulo básico recentemente publicado: Vasconcelos, L. A.; Naves, A. R. C. X. & Ávila, R. R. (2010). Abordagem Analítico-Comportamental do Desenvolvimento. Em: Tourinho, E. Z. & Luna, S. V. (Orgs). Análise do Comportamento: Investigações históricas, conceituais e aplicadas. pp. 125-151.
Há ainda um excelente texto escrito pela Maria Amélia Matos e que vale a pena ser lido: Matos, M. A. (1983). A medida do ambiente de desenvolvimento infantil. Psicologia, 9(1), pp. 5-18.


Por enquanto é isso! :)

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

A injustiça nas críticas dirigidas a Piaget (Parte 1)


A obra de Piaget é de inquestionável valor para a Psicologia. Ainda assim, muitos psicólogos dirigiram críticas claramente injustas aos princípios piagetianos. Confesso que nunca me dediquei integralmente ao estudo da obra piagetiana e, por isso, nunca me detive por mais tempo a uma defesa diante de críticas equivocadas. Recentemente, soube de um texto do Lourenço e do Machado, publicado em 1996, intitulado “In defense of Piaget's Theory: A Reply to 10 Common Criticisms”. Gostei tanto do artigo que decidi resumi-lo no blog. Eu tratarei de duas críticas por post. Vale dizer que o resumo está muito aquém do artigo. Portanto, aconselho fortemente que os interessados dirijam-se ao texto integral de Lourenço e Machado.

AS 10 CRÍTICAS

1.       A teoria de Piaget subestima a competência das crianças.


Alguns críticos sugerem que Piaget produziu avaliações muito conservadoras sobre as competências infantis, principalmente em crianças no período pré-operatório. Afirma-se que o padrão de tarefas piagetianas leva a erros do tipo falso-negativo: não se atribui à criança as competências que de fato ela tem e que seriam reveladas quando os fatores de desempenho fossem mais bem controlados. Para tanto, novas tarefas têm sido elaboradas, julgando-se que elas detectariam melhor a complexidade cognitiva infantil. Por exemplo, pesquisadores usam agora a reação de surpresa como critério de detecção da construção do conceito de “objeto permanente”, ao invés de usar como critério, tal como sugeriu Piaget, a busca ativa pelo objeto. 
Por meio da tarefa que analisa a "reação de surpresa", pode-se concluir que a construção do objeto permanente já existiria aos 3 ou 4 meses de idade. Os críticos sugerem, assim, que Piaget teria cometido um grave erro ao afirmar que a construção do conceito apareceria apenas mais tarde na criança. São críticas prematurasEm primeiro lugar, a idade de aquisição não é um conceito chave na teoria de Piaget. A chave estaria na sequência de transformações pelas quais a criança passa. Em segundo lugar, a reação de surpresa pode ocorrer em função de uma competência perceptual, não fornecendo evidências conclusivas de que a competência conceitual (objeto permanente) é a responsável pela reação. Por fim, o “conhecimento” envolve implicações e inferências lógicas e, portanto, a presença da competência analisada não pode ser inferida apenas estatisticamente, de forma a recair em riscos teóricos (por exemplo, confundindo-se competência conceitual com perceptual).
No artigo, Orlando e Machado apresentam outros exemplos de como a teoria piagetiana tem sido equivocadamente compreendida, mostrando que as novas tarefas propostas podem envolver a avaliação de estruturas lógicas diferentes daquelas que foram estudadas nas tarefas de Piaget.  Embora não se negue aqui a possibilidade das crianças serem, de fato, mais competentes do que Piaget acreditava, os estudos não são convincentes por recaírem em erros metodológicos básicos e confusões conceituais. Acreditando que Piaget subestima a competência de crianças, os críticos falharam ao recair em erros falso-positivos: atribuíram às crianças competências do nível operatório que seriam, na verdade, do nível pré-operatório.


2. A teoria de Piaget fornece normas de idade


Piaget associou cada período do desenvolvimento a idades específicas. Alguns críticos sugerem que se as idades em que se observa cada período forem muito discrepantes daquelas apontadas por Piaget, isso será um grande problema para a teoria. A crítica falha ao assumir que Piaget equacionava a cronologia à aquisição de algo. Piaget não considerava a idade como critério do nível de desenvolvimento. Ele tomava como elemento chave a sequência das transformações cognitivas e não sua cronologia. A idade é um indicador, não um critério. Portanto, alterações nas faixas etárias não invalidam a teoria piagetiana.


Para sabe mais: 
Lourenço, O.; & Machado, A. (1996). In defense of Piaget's Theory: A Reply to 10 Common Criticisms. Psychological Review, v. 103(1), pp. 143-164.